Berço da cultura ocidental, a
civilização greco-romana permitiu uma nova concepção política baseada, mesmo
que limitada, na participação popular, na cidadania, na representatividade e no
direito romano, o que permitiu regular e organizar a sociedade através do
aparato legal.
O exemplo de Atenas nos permite
observar que durante o século VI A.C, Dracon criou as Leis Draconianas (620
A.C) que davam ao conselho dos anciãos o poder de julgar os crimes graves e
punir os infratores com a morte ou com o exílio. O Código Draconiano ficou
conhecido como algo cruel na História, e consagrou o poder paterno sobre a
família favorecendo a aristocracia agrária e ignorando os pobres.
O longo caminho da criação dos
direitos políticos e da participação popular perpassavam pela superação das
hierarquias sociais, do domínio da aristocracia e da tirania. Nesse período, a
aristocracia possuía amplos poderes de executar reformas sociais e políticas, e
esta ação facilitava o domínio de classes dominantes sob as demais.
O aristocrata Sólon, eleito no
magistrado em 594 A.C, resolveu proibir a escravidão por dívidas, facilitando o
retorno a vida social daqueles que haviam sido vendidos como escravos. Sólon
também estabeleceu quatro categorias de cidadãos através do critério censitário
com base na renda anual e não mais no nascimento, determinando que todos os
homens nascidos em Atenas, proprietários ou não de terras, capazes de custear a
participação no exército, tornavam-se cidadãos. As reformas de Sólon geraram
insatisfações sociais, e favoreceram o surgimento da tirania de Pisístrato, que
em 545 A.C resolveu tomar o poder.
O reinado de Pisístrato favoreceu
as famílias de agricultores, que receberam terras de nobres exilados e
empréstimos para o cultivo. Em seu governo, o comércio e a colonização na
Trácia foram incentivados, grandes obras públicas foram realizadas o que
permitiu o emprego aos cidadãos mais pobres. Na tirania não havia participação,
o tirano governa suprimindo liberdades individuais e coletivas, não exercendo
aos cidadãos o direito da cidadania.
Se as legislações atenienses
criadas até então determinaram o alcance de direitos pontuais, como funcionava
a cidadania?
A cidadania moderna prevê o reconhecimento
dos cidadãos que são considerados um corpo comum na sociedade em situação de
igualdade de direitos. Dadas as diferenças sociais, a cidadania estabelece que
o corpo de cidadãos possua direitos comuns, que dividem-se em direitos
políticos, civis e sociais. No entanto, este conceito de cidadania é uma
definição contemporânea e burguesa. No mundo grego a cidadania estabelecia o
reconhecimento da própria desigualdade entre os cidadãos apontando funções
sociais que determinavam quem possuía direitos de participação política.
Voltemos ao governo de Pisístrato,
que ao morrer em 510 A.C foi sucedido por seu filho que não conseguiu manter-se
no poder e foi sob forte apoio popular substituído por Clístenes, que inaugura
a democracia em Atenas.
Considerado “pai da democracia
grega”, Clístenes estabeleceu uma grande reforma política em Atenas. Ele incluiu
no corpo de cidadão majoritariamente formado por aristocratas e proprietários
de terras, os libertos ( cidadãos nascidos livres e ex-escravos), também
separou os cidadãos em dez tribos e 160 divisões administrativas – demos. Cada tribo pertencia a uma
região: interior, litoral e cidade, e tinha o direito de escolher seu próprio
representante político. Outra ação importante de Clístenes foi a criação do
ostracismo, que cassava os direitos políticos dos cidadãos por dez anos, caso o
individuo fosse considerado uma ameaça para a democracia.
Apesar de ampliar a cidadania,
Clístenes reforçou o domínio e controle dos cidadãos mais ricos sob os demais.
A democracia ateniense combinava a democracia direta de participação popular –
incluindo todos considerados cidadãos, com a democracia representativa onde
prevalecia o poder dos mais ricos.
Os cidadãos mais ricos tinham a
vida dedicada a filosofia e à política. Na Ágora, espaço de tomada de decisões,
eles decidiam sobre o funcionamento da polis e do grupo social. Diferente dos
grupos sociais mais pobres que dedicavam sua vida ao trabalho, trabalhavam lado
a lado com seus escravos, e por isso não possuíam tempo para dedicar sua vida à
política, visto que necessitavam prover o sustento da família.
Sob esta organização civil e
política, nota-se que a democracia grega definia os direitos de forma desigual,
não só por ter a classe dos mais ricos controlando a política. Se
conceitualmente demos significa povo
e cracia governo, nota-se que a
democracia grega não era para todos. Somente os homens livres, de pai e mãe
ateniense, maiores de 18 anos e nascidos na cidade eram considerados cidadãos, mulheres,
metecos (estrangeiros que viviam em Atenas) escravos não possuíam nenhum
direito político nem acesso à cidadania. A própria democracia ateniense incluía
em sua organização a escravidão como base econômica restringindo a liberdade
individual de grande parte dos membros da sociedade.
Continuando a discussão sobre a
noção de representatividade, observamos que o próprio conceito de democracia
teve que ser revisto e incorporado em noções de liberdade e igualdade de
direitos, que fizeram parte dos ideais burgueses para atingir a participação
popular e permitir o direito político a todos os cidadãos.
No que se refere ao conceito de
república democrática, que implica numa forma de organização do Estado, onde o principal canal de participação dos cidadãos é o voto
livre, universal, direto e secreto para a eleição de um parlamento estabelecido
pela divisão de poderes: executivo, legislativo e judiciário, nota-se que
evolução deste tipo de governo não viabilizou em primeiro lugar a participação
da maioria.
Apesar do conceito de república
prever a participação de todos, na sociedade romana, os patrícios dominavam as
terras, a política e as riquezas de Roma, restando aos demais cidadãos
prestarem serviços e pagarem impostos. A estrutura da república romana era
dividida da seguinte forma: 1)Cônsulado: os
cônsules eram os chefes da República, com mandato de um ano; eram os
comandantes do exército e tinham atribuições jurídicas e religiosas.
2)Senado: composto por 300 senadores, em geral patrícios.
Eram eleitos pelos magistrados e seus membros eram vitalícios.
Responsabilizavam-se pela elaboração das leis e pelas decisões acerca da
política interna e externa. 3)Magistraturas: responsáveis por funções executivas e judiciária, formadas em geral
também pelos patrícios. 4)Assembleia Popular: composta de patrícios e plebeus; destinava-se a
votação das leis e era responsável pela eleição dos cônsules.
A imagem representa os patrícios no Senado. |
A República romana garantia aos
patrícios o domínio do poder, na medida em que, possuíam o maior número de
votos nas assembleias, dominavam o senado e ocupavam o lugar de cônsules no
governo. Já os plebeus possuíam uma votação mínima e não conseguiam competir
com os patrícios, sofrendo sempre suas imposições políticas e regras, além de
serem presos caso discordassem das leis criadas pelos patrícios.
Diante da situação de exclusão
política, os plebeus passaram a protestar contra o domínio dos patrícios
exigindo direitos e participação na política. A luta entre patrícios e plebeus
gerou um conflito entre classes. Como consequência das reivindicações, os
plebeus criaram o Tribunal da Plebe em 326 A.C. O Tribunal da Plebe garantiu os
direitos aos plebeus a partir do reconhecimento de uma assembleia popular com
direito de veto nas decisões dos cônsules. Esta interferência ocorria sem que
os plebeus fossem presos ou punidos por discordar de uma decisão política.
Os exemplos da História ilustram
que a política durante a antiguidade se solidificou como um instrumento de
dominação de classes, tal situação permanecerá durante a Idade Média e Moderna
sendo solidificada por diferentes formas de governo que buscaram cada vez mais
minar a participação e representatividade popular. A revolução burguesa modificará
este cenário introduzindo a legislação liberal como forma de garantir a
igualdade de direitos, mas também pecará na utilização do Estado para favorecer
os interesses do capital. Mas essa já é outra História...
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